Foto: Redes Sociais (Reprodução)
Ana Júlia Correa Vieira tinha 19 anos
Uma jovem estudiosa, determinada e cheia de sonhos. Assim Maria Carmelinda Corrêa, 56 anos, descreve a filha Ana Júlia Corrêa Vieira, 19, estudante de Engenharia Elétrica da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) que morreu após ser levada pelas águas do Rio Jacuí no fim da tarde de terça-feira (4). Ela tomava banho em uma cascata com amigos quando as comportas de uma hidrelétrica que fica na região foram abertas. Com a rápida elevação da água, Ana Júlia não conseguiu sair a tempo.
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Filha única, Ana Júlia nasceu em Cruz Alta, mas foi criada em Salto do Jacuí, onde mora a família. A mãe trabalha em uma fábrica de calçados da cidade, enquanto o pai é um ex-caminhoneiro.
– Nós erámos muito unidas. Mesmo ela morando em Santa Maria, a gente não dormia sem fazer uma oração juntas, por chamada. A gente sempre se falava, todos os dias – conta Maria Carmelinda.
Desde criança, Ana Júlia sempre foi estudiosa. A mãe relata que ela aprendeu a ler cedo, na pré-escola. Durante o Ensino Médio, intercalava as aulas com o curso técnico em Eletromecânica, em que se formou com 16 anos. Além disso, também se formou em um curso técnico de Saúde Bucal e chegou a atuar como auxiliar em um consultório odontológico na cidade. No início de 2023, a jovem ingressou no curso de Engenharia Elétrica na UFSM.
– Não estou falando isso porque sou mãe. Mas a Ana era iluminada, um ser humano incrível, um ser humano de luz. Fez amigos por onde passou. Era estudiosa, determinada e amava a natureza. Virava as noites estudando - orgulha-se a mãe.
Um das atividades preferidas de Ana Júlia quando visitava a família era dar um mergulho no Rio Jacuí. Maria relata que a filha sabia nadar desde criança. Assim, em um dia quente, típico de verão, ela decidiu ir até a Cascata do Saltinho com um grupo de amigos. Não era um lugar que costumava frequentar, mas tinha interesse em conhecer. De acordo com a mãe, é um local bastante frequentado pelos moradores de Salto do Jacuí.
– Eu falei no velório que as águas do rio levaram a Ana, porque ela tinha uma paixão por água, adorava nadar. Porém, não foi a água, foi a ação do homem - afirma.
Segundo a mãe, amigos que estavam com Ana na cascata relataram que a água teria subido rapidamente após a abertura das comportas. Foi nesse momento que eles decidiram sair da água. Ana, que estaria perto de algumas pedras, sumiu no meio da correnteza formada repentinamente. Após isso, as comportas teriam sido fechadas e a vazão da água diminuiu.
As buscas tiveram início, inclusive com o apoio de bombeiros de Cruz Alta, mas era tarde demais. O corpo da estudante da UFSM foi encontrado horas depois, a cerca de um quilômetro do local onde estava:
– Quando fui avisada do que aconteceu e cheguei lá, os amigos dela estavam em pânico. Precisaram se segurar em alguns galhos por causa da correnteza, eles estão com arranhões pelo corpo.
Maria discorda da versão dada pela concessionária responsável pela hidrelétrica de que um sinal sonoro é emitido quando as comportas são abertas. Além disso, reforça que não há sinalização no local de alerta aos visiantes:
– Eles (amigos da Ana) afirmaram que não ouviram nenhuma sirene tocar. É só ver nas redes sociais, muitas pessoas relatam que já passaram por isso, de estarem lá e não tocar nada. Mas, dessa vez, a vida da minha filha foi levada.
Nas redes sociais, um dos amigos que estava com a universitária quando a tragédia ocorreu fez uma publicação sobre o fato. Ele contou o que teria acontecido:
"Quero esclarecer que ninguém que estava no Saltinho escutou qualquer sirene ou foi avisado sobre a abertura das comportas. De repente, veio uma forte onda de água no momento em que as comportas foram abertas. Algumas famílias ficaram presas em cima das pedras, e as pessoas que estavam na parte mais baixa saíram às pressas da água. Infelizmente, Ana, que estava um pouco mais distante, não conseguiu se salvar e foi levada pela correnteza, que veio de forma repentina. Ygor foi um herói, conseguiu salvar minha namorada, pois ele estava mais próximo da Kamilly." Confira o relato na íntegra:
Questionada sobre o que espera do futuro, Maria Carmelinda afirma que aguarda os desdobramentos da investigação policial e espera que alguém seja responsabilizado:
– Não queremos dinheiro, não há valor que pague a vida da minha filha. Mas não queremos que mais ninguém perca sua vida lá. Alguém tem que ser responsabilizado – finaliza.
Investigação
A Polícia Civil do Salto do Jacuí instaurou um inquérito, na quarta-feira (5), para investigar as circunstâncias da morte da universitária. Os primeiros depoimentos teriam sido coletados na quinta-feira (6).
Posicionamento da hidrelétrica
A Companhia Estadual de Geração de Energia Elétrica, a CEEE Geração, responsável pela hidrelétrica do Salto do Jacuí, divulgou nota sobre a morte da universitária. Confira o texto na íntegra enviado à reportagem na quinta-feira:
"A CEEE Geração lamenta profundamente a fatalidade ocorrida na terça-feira, 4/03, na cascata do Saltinho, em Salto do Jacuí, cujo acesso está em propriedade de terceiros, sem vínculo com a empresa.
A CEEE Geração reforça que todos os procedimentos operacionais na barragem Maia Filho são realizados rigorosamente conforme as diretrizes do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). É importante esclarecer que a usina é despachada pelo ONS, ou seja, o órgão define o início e o fim da geração de energia de acordo com a demanda no Rio Grande do Sul e no Brasil. Como parte do procedimento operacional, a sirene é acionada sempre que há aumento da vazão para geração de energia elétrica, sendo que o volume de água liberado depende da quantidade de energia determinada pelo ONS.
A CEEE Geração reitera seu pesar e se solidariza com os familiares e amigos da jovem neste momento de dor."
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